Ao Presidente Lula, à D.
Marisa
e à Nação Brasileira
Nós,
mulheres educadoras da Rede de Educação Infantil Comunitária da Região
Metropolitana do Rio de Janeiro, pedimos cinco minutos de sua atenção para a
situação de milhões de crianças entre 0 e 6 anos que hoje estão matriculadas em
creches e pré-escolas comunitárias e beneficentes deste imenso país.
Em
nossos municípios, como na maioria dos centros urbanos brasileiros, é cada vez
mais comum encontrarmos crianças de 3, 4 e 5 anos trabalhando e zanzando pelas
ruas! Mas a atenção da sociedade só se
volta para elas quando já estão maiores, quando já são capazes de ameaçar!
Então, os jornais e a TV falam dos meninos e meninas que estão nas ruas como se
já tivessem nascido ali, brotado do asfalto! Esquecem de lembrar que essas
crianças já tiveram 3 meses, 3 anos. E estão hoje nas ruas por serem filhos de políticas
econômicas que concentram a renda; filhos da fome, da miséria física e
espiritual de seus pais e da sociedade em que vivem. Os meios de comunicação
falam dos adolescentes de rua como se tivessem nascido grandes... Mas, é bom
perguntar: quem cuidou dos bebês que têm, hoje, 13, 15, 18 anos?
De
acordo com o artigo 227 da Constituição Brasileira "É dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente com absoluta
prioridade, o direito à vida, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los à salvo de toda forma de
negligência, violência, crueldade e opressão".
É
em nome deste preceito constitucional que nos dirigimos à nação brasileira, em
especial ao presidente Lula e à sua esposa, D. Marisa, assim como aos
congressistas e governantes estaduais e municipais.
Somos
mulheres educadoras! Desde finais da década de 70, assumimos a responsabilidade
de cuidar de crianças pequenas, cujas mães, moradoras dos bairros mais pobres
da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, precisavam trabalhar fora de casa.
Com o objetivo primeiro de tirar as crianças da fome, do abandono, da falta de
higiene e saúde, nos mobilizamos, conquistamos e organizamos espaços destinados
a acolhê-las: uma casa, um barraco, um salão da igreja ou da associação de
moradores. Pouco a pouco, o compromisso com as crianças nos levou aos bancos
escolares, ao curso normal, e até mesmo à universidade, buscando uma formação
que nos torne capazes de contribuir para o seu desenvolvimento integral.
Hoje
sabemos que esta não foi uma iniciativa isolada; que não apenas no Rio de
Janeiro, mas também em Recife, em Salvador, São Luís, Fortaleza, Natal, Belo
Horizonte, Belém, Porto Alegre, ou, mesmo em cidades menores, foram surgindo,
Brasil afora, milhares de creches e pré-escolas comunitárias. Um número
indefinido destas instituições conseguiu firmar convênios com organizações
governamentais e não-governamentais, mas são muitas as que asseguram a sua
sobrevivência graças à garra de seus educadores, à solidariedade de pequenos
comerciantes locais e ao apoio de moradores das comunidades.
Para
se ter idéia da situação, em 2001, estas instituições atendiam a mais da metade
das crianças brasileiras de 0 a 3 anos que freqüentam creches no Brasil. Por
esta razão, e pelo fato de prestarem serviços à população mais pobre do país,
afirmamos que muitas das creches comunitárias são instituições públicas-não
estatais! Elas se anteciparam aos governos municipais e estaduais no
cumprimento do dever de assegurar o acesso a educação infantil onde não havia
equipamentos estatais. Entretanto, caso o Congresso Nacional aprove a Medida
Provisória nº 339, as crianças matriculadas nestas instituições comunitárias
e beneficentes não terão acesso aos recursos do FUNDEB e continuarão como
peças da economia informal, invisíveis para o poder público.
Se
a Constituição Federal e a LDB afirmam o direito destas instituições aos
recursos públicos; se o Brasil é um país de todos, como diz o nosso Presidente,
então por que as crianças matriculadas em creches e pré-escolas comunitárias e
beneficentes não terão direito aos recursos do FUNDEB?
O
argumento que fundamentou o Artigo 8 da Medida Provisória nº 339 é o de que o
repasse de recursos tem se constituído como mecanismo de evasão de verbas
públicas para setores privados. A nossa
resposta a este argumento é a de que “público” não é sinônimo de
“estatal”! Num país em que o Estado, historicamente, trabalhou a serviço do
privado, a questão da evasão de recursos não pode ser resolvida através de
simples corte, mas pelo estabelecimento de critérios que assegurem
transparência ao repasse e inaugurem novas relações entre estado e sociedade.
Sr Presidente, D. Marisa, Srs congressistas e governantes estaduais e
municipais, cidadãs e cidadãos brasileiros! Nosso Movimento de Luta por Creche
alimenta o sonho de que a lei maior de nosso país seja respeitada. Isto é, que
independentemente de classe social,
etnia, cultura ou gênero, todas as crianças gozem do direito de acesso a
educação infantil; que todas as crianças sejam dignamente, carinhosamente,
respeitosamente cuidadas e educadas, independentemente da natureza da
instituição, entidade, ou grupo que realize e/ou assuma a responsabilidade do
atendimento.
Sem os recursos do FUNDEB, sem o
apoio pedagógico e financeiro das Secretarias Municipais de Educação é impossível que creches comunitárias
assegurem um serviço de qualidade para as crianças cujas famílias vêm sendo historicamente
excluídas dos direitos mais elementares de cidadania.
Basta de convênios indignos, que
alimentam com migalhas a sobrevivência das nossas creches. Não às políticas
conservadoras, clientelistas e eleitoreiras que visam transformar as
iniciativas populares em programas educacionais de baixo custo, que ampliam o
atendimento, mas não asseguram qualidade. Não aos programas de atendimento que,
em realidade, isentam o Estado e penalizam a parcela mais pobre da população! Queremos
acesso aos recursos públicos! Queremos transparência nos mecanismos de repasse!
Queremos ser incluídas nos processos de elaboração e definição de políticas
públicas voltadas para a Educação e a Assistência às crianças pequenas em nosso
país. Temos o direito de ser incluídas nos programas do MEC voltados para a
educação infantil!
Nesse sentido:
-
pedimos aos congressistas a revisão do Art. 8 da Medida
Provisória nº 339 de 28/12/06, com base nos art 213 da Constituição e o art. 77
da LDB, que asseguram repasse de verbas
para instituições comunitárias.
-
pedimos ao Presidente Lula e à sua esposa, D. Marisa,
que, pessoalmente, interfiram neste processo.
-
solicitamos ao MEC, que convoque um amplo seminário dedicado
ao debate de experiências de conveniamento e à discussão de critérios de
financiamento e repasse de recursos.